A sociedade em conta de participação (SCP) e sua utilização no direito brasileiro
Neste artigo trataremos dos aspectos societários da Sociedade em Conta de Participação (SCP).
A SCP tem previsão expressa nos artigos 991 a 996 do Código Civil Brasileiro (Lei nº 10.406/02) que a considera uma “sociedade não personificada”. Isso significa dizer que estamos diante de uma sociedade que será sempre representada pelo sócio ostensivo, conforme comentaremos a seguir, e seu ato constitutivo não precisa ser levado a registro na Junta Comercial. Mesmo nos casos em que existir o registro opcional de seus atos constitutivos em cartório, isto não dotará a SCP de personalidade jurídica.
Dito isto, a Sociedade em Conta de Participação está impossibilitada de ser titular de direitos, contrair obrigações, não será parte em processo judicial ou administrativo, não possuirá patrimônio próprio, sede, não precisa de requisitos formais para sua constituição (inclusive forma escrita) e não adota denominação social. Sendo assim, qual a sua aplicabilidade?
O contrato de Sociedade em Conta de Participação é celebrado entre pessoas, física ou jurídicas, que reciprocamente se obrigam a contribuir, seja com bens ou serviços, desde que úteis aos negócios da SCP, para alguma atividade econômica – geralmente um empreendimento definido ou um projeto específico, existente ou a ser realizado por uma das partes que decidiu buscar parcerias para sua execução. Findo o empreendimento e satisfeitas as obrigações decorrentes do negócio, distribuídos os lucros e prejuízos, sua continuidade perde significado. Citando o professor e jurista Rubens Requião, a Sociedade em Conta de Participação é um instrumento de captação de recursos financeiros para desenvolvimento econômico, com amplas e uteis aplicações.
São muito utilizadas para (l) estruturar negócios imobiliários, onde a construtora fica como responsável por todo o gerenciamento das obras; (ll) exploração de pools hoteleiros onde existe a sociedade que administra o negócio, especializada na administração de bens de terceiros, contratando com os proprietários dos imóveis; (lll) projetos florestais, com a participação de investidores que visam o recebimento de parcela do plantio das árvores após o reflorestamento; (lV) estruturação de parcerias internacionais ou nacionais (subespécie de joint venture), dentre outras.
A SCP é formada por um SÓCIO OSTENSIVO e um SÓCIO PARTICIPANTE que contribuem para a formação do fundo social e participam dos resultados alcançados pela sociedade por meio de recebimento de lucros. Ao SÓCIO OSTENSIVO cabe gerir o negócio e representar a sociedade perante terceiros, como se a SCP não existisse, contratando em seu próprio nome, assumindo direitos e obrigações (art. 991 CC). O SÓCIO PARTICIPANTE se obriga exclusivamente perante o SÓCIO OSTENSIVO, ficando com os bônus ou ônus advindos da gestão que esse realiza dos negócios.
É por isto que a celebração de um contrato de constituição da SCP com cláusulas que delimitem bem as obrigações e a forma de acompanhamento dos negócios pelos sócios, se mostra imprescindível para tranquilidade das partes contratantes. Trata-se de uma questão de ordem prática disciplinar de forma pormenorizada as condições do negócio, deixando de forma inconteste sob quais condições e para qual propósito a SCP fora entabulada. Lembrando que o SÓCIO OSTENSIVO responde ilimitadamente perante terceiros, ao passo que o SÓCIO PARTICIPANTE apenas responde em face do SÓCIO OSTENSIVO até o limite previsto no contrato.
Ainda que não previsto no contrato, o parágrafo único do art. 933 do Código Civil garante ao SÓCIO PARTICIPANTE o direito de fiscalizar a gestão dos negócios sociais praticados pelo SÓCIO OSTENSIVO, portanto, importante deixar expresso no contrato de constituição a real intenção dos sócios com a parceria realizada, suas expectativas e forma de resolução de eventual impasse durante a sua vigência, dentre outros aspectos relevantes vinculados ao objeto da parceria na qual o SÓCIO PARTICIPANTE realiza sua contribuição.
Muito utilizada para a captação de investidores para execução de um projeto ou empreendimento, não raro o SÓCIO OSTENSIVO busca novas associações para a SCP, entretanto, qualquer alteração na composição societária, seja admissão de novo sócio ostensivo ou participante, necessita de consentimento expresso do SÓCIO PARTICIPANTE. Na hipótese de existir mais de um sócio ostensivo, as partes adicionalmente disciplinarão a quem cabe e, em que medida, as obrigações de cada um deles na busca da execução do objeto social e perante os sócios participantes.
O Direito Brasileiro ainda confere à Sociedade em Conta de Participação a aplicação, de forma subsidiária e no que com ela for compatível, das normas que regem as sociedades simples. Tal previsão contida no art. 996 do Código Civil confere regramento para sua liquidação, prestação de contas, dissolução em caso de falência do SÓCIO OSTENSIVO (hipótese na qual o SÓCIO PARTICIPANTE passa a figurar como credor), regras para sua extinção nos casos em que a sociedade não possuir prazo ou empreendimento determinado.
Não aprofundaremos sobre questões fiscais da Sociedade em Conta de Participação que será objeto de artigo em apartado, entretanto, como fizemos a colocação quanto à ausência de personalidade jurídica conferida pelo Direito Societário, é relevante apontar que a legislação fiscal federal a equipara a Sociedade em Conta de Participação às demais pessoas jurídicas. Na apuração dos resultados da SCP serão observadas as normas aplicáveis às pessoas jurídicas em geral, conforme previsto no artigo 161 do Regulamento do Imposto de Renda (Decreto 9.580/2018), e tributação incidente.
Importante, por fim, alertar quanto a ilegalidade de utilização da SCP para substituir um contrato de prestação de serviços. A Sociedade em Conta de Participação constituída para este fim poderá ser alvo de fiscalização e, identificado o pagamento de distribuição disfarçada de lucros, poderá ocorrer a autuação do SÓCIO OSTENSIVO e SÓCIO PARTICIPANTE para pagamento, de forma retroativa, de todos os tributos incidentes sobre a prestação de serviço (paga por meio de distribuição de lucros), notadamente imposto sobre a renda, além da cobrança dos juros de mora e multa. Em algumas situações poderá ocorrer, inclusive, a uma representação fiscal por entendimento de prática de crime contra a ordem tributária.
Nossa equipe jurídica conta com especialistas nas áreas que impactam, direta ou indiretamente, uma estruturação de Sociedade em Conta de Participação, com condições de oferecer a melhor estrutura do contrato de constituição. A depender da análise societária e tributária realizada, citando estas duas especialidades por ser as mais demandadas, podemos inclusive sugerir um acordo de sócios da SCP para que as questões entabuladas entre os sócios fiquem integralmente resguardadas, ou para que sejam previstas regras de sucessão, direito de preferência, garantias, confidencialidade, dentre outras. Conte com nossa parceria para realização do seu negócio com segurança e efetividade.